quinta-feira, 9 de julho de 2009

ALTA TRAIÇÃO

Ah, Federico, eu não posso perdoar; que aparte um pouco Cristo de meu peito para dizer: não posso perdoar. Se matar é o uivo que rasga as trevas onde esconde Deus, se a morte dada pelo homem é o vômito de chama dos mais altos cárceres, como me podem pedir para perdoar? Esses versos do poeta português Pedro Mexia, que me tocam a alma como um dos mais pungentes entre os que, de sessenta anos para cá, se referem ao assassinato de Federico Garcia Lorca, acabaram traduzindo o que sinto neste momento.

Fazer calar, pelo fogo das balas, a voz do grande poeta e dramaturgo – voz de pureza ímpar – foi um crime contra a Espanha, um crime contra a humanidade, um crime contra a verdadeira poesia que emana do coração do povo.

Pedro Mexia volta a socorrer-me, enquanto não encontro palavras, pois todas me sufocam e se trancam na garganta, para dizer o que me levou a colocar o papel na máquina: celebro, agora, de vermelho e negro, a queda milagrosa, vertical do teu corpo, o sudário que se tornou uma folha seca ao vento, que pousou ondulante no teu rosto de poeta amado. Vinte e cinco horas teve o dia, que os deuses acrescentaram àquela em que caíste covardemente, condenado por quem não tinha ombros bastantes para o peso doce e frondoso de um verso.

Galdino não era poeta. Não deixa obras publicadas nem peças a serem representadas nos palcos do mundo inteiro. Mas também era homem de voz pura e, na pureza da voz da natureza e na voz das ais puras tradições de nossa gente, ei-lo irmanado aos que fazem da vida um ato de beleza.

Que estranho desígnio teria dado a Galdino também o nome de Jesus? Ei-lo, portanto, irmanado, em sacrifício, a Cristo. Como choramos Cristo, assim te choramos, Galdino; choramos teu corpo envolto em chamas.

Para crimes assim de lesa-humanidade, tivemos, há meio século, o Tribunal de Nuremberg, que expôs os réus à execração mundial.

Ah, Galdino, eu não posso perdoar. Tu, santo índio; tu, poeta, Cristo, perdoa que te diga que não posso perdoar.

quinta-feira, 28 de maio de 2009

VIAGEM ESTELAR DE TRÊS CARAVANEIROS.

Um grãozinho de areia, mais outro e outro mais e enchemos a mão de areia.
Abrimos lentamente a mão, deixamos cair a areia.
E quem sabe quando os grãos do punhado que juntamos voltarão a se reunir de novo?
Areia. Areia do deserto. Um deserto tão grande, feito só de grãozinhos de areia.
É impossível distinguir um grão do outro.
Quem os teria feito tão iguais?
Indecifráveis eles são.
Quem pode adivinhar o destino de um único grão de areia?
Tão iguais um ao outro. E cada um tem o seu destino.
Cada um tem o seu destino.
Qual será o destino do grão de areia derradeiro?
O deserto nos ensina muitas coisas. E ensinou a nossos antepassados.
Mas não nos conta os seus segredos.
Os segredos dos indecifráveis grãos de areia que são o corpo do deserto.
Tantos grãos, tão semelhantes e de destinos tão diversos.
Caravaneiros, da mesma caravana e cada caravana com seu destino.
Ouro, ouro. Ouro é a areia do deserto refulgindo ao sol (areia).
A areia que escreve e logo apaga os nossos sulcos, quando o vento a revolve!
Somos homens do deserto. Amamos a amplidão desse deserto que parece não acabar nunca.
Amamos as suas miragens. Sabemos que são enganosas como o sonho...
Deserto, deserto, areia e promessa de oásis.
Bendito o homem que ama o seu deserto e não ambiciona que a vida seja um oásis maior do que o céu e a terra.
Loucos, loucos, loucos somos todos nós.
O sol radiante do deserto já está morrendo.
O céu está ficando vermelho de sangue.
É hora de partir.
A viagem à noite será agradável.
Uma estrela nos guiará.
Vocês não acham estranho que nossa carga seja outro, incenso e mirra?

quarta-feira, 27 de maio de 2009

Não sei se arteiro ou artista, tenho vivido a divertir-me e a divertificar-me em todos os ramos da arte da palavra, por juulgar, desde menino, que, bem feitas as contas, são um só o ator, o dramaturgo, o romancista, o cronista, o poeta e mais todo o rol que intenta traduzir emoções do ser humano. Teatro é a poesia que se levanta do livro - dizia Garcia Lorca. E eu concordo.
Em longo percurso pelos caminhos da arte, só me resta agradecer a boa acolhida que a simpatia do público ofereceu a este viandante solictário.
Aplauso, em cena aberta, em minha estréia, no Theatro São Pedro, em 1948. Placa de bronze, na mesma casa de espetáculos, em 1983. Título de Cidadão Emérito de Porto Alegre.
"Rubiáceas em Maringá" (história romanceada do Café), ganhou prefácio mais do que elogioso de João Bigotte Chorão, então presidente do Círculo Eça de Queiróz, de Lisboa; palavras de candente admiração de Antonio Carlos Villaça, e crítica mais do que alentadora de José Mário Silva, em página inteira do Suplemento do Diário de Notícias (Lisboa).
A mesma sorte recaiu em "Herança da luta de Abilio de Nequete, com pósfascio de Maria Helena Kuhner, que salienta cigorosamente as qualidades do memorial.
O que falta saber de mim ´e é tanto! - é melhor deixar para outra ocasião. E aí vãos as crônicas, na esperança de que elas agradem tanto a vocês quando vieram agradando, dia após dia, minha fraterna amiga, Abigail Dias, que se deu ao trabalho de digitá-las.
Por que escrever? Por que? Para que, em certa hora, o autor, angustiado, releia a vida no espelho do passado. Porque o autor é ele mesmo o mais tudo o que nele viveu.

terça-feira, 26 de maio de 2009

Edison Curie de Nequete - (Edison Nequete ou E. Nequete - nomes artísticos). Nascido a 21 de julho de 1926, em Porto Alegre. Filho de Abílio de Nequete e Rafaela Jorge Nequete, ambos libaneses, radicados no Rio Grande do Sul, desde oinício do Século XX. Estudou até o terceiro ano primário no Colégio Souza Lobo e até a 4a. série, no Ginásio Anchieta.
Fraternalmente, Abigail Dias me oferece espaço aqui. Ela acha que vocês gostarão de me conhecer. Conhecer?
Penso, logo existo.
Logo, só existo quando penso?
Penso, para existir?
Existo... para pensar, ou penso... para existir?
Eu sou obrigado a pensar?
O pensamento tem vida autônoma?
Será que eu posso viver independentemente de meu pensamento?
E o pensamento - aí é que são elas! - existiria sem mim?
Meu último pensamento, por enquanto: pode ser que eu exista somente para justificar a existência do pensamento.